
Comunicado
Reforma do Mapa Judiciário em Lisboa – da propaganda política à dura realidade
A ASJP entregou ao Governo o seu parecer sobre o projecto de Decreto-Lei que alarga a Lisboa o regime do novo mapa judiciário. De acordo com a avaliação feita, partindo do conhecimento das experiências do passado e da realidade prática nos tribunais, esta reforma tem todos os condimentos para correr mal. Por isso, à beira da mais que previsível desorganização da capacidade instalada nos tribunais judiciais de primeira instância de Lisboa, que demorará anos a superar, a ASJP entende adequado tornar público o seu entendimento e o parecer apresentado.
Os tribunais judiciais de primeira instância de Lisboa têm uma pendência global superior a 424.000 processos (estatística oficial, bem inferior à real), correspondente aproximadamente a 25% de todos os processos do país, distribuídos por 212 juízes em funções (178 de quadro e 34 auxiliares), o que equivale a uma média de 2.382 processos por cada juiz efectivo. A comparação dos indicadores de desempenho de Lisboa com a média nacional é bastante desfavorável: a taxa de eficiência na resolução de processos é 35% inferior à média nacional e a demora dos processos é 104% superior à média nacional.
A reforma projectada implicará, em Lisboa, a redução de 16,2% no quadro de juízes, para 149 lugares, o que determinará um aumento médio do número de processos pendentes por cada juiz efectivo de 19,4% (2.382 para 2.845). Nessa reforma prevê-se, também, uma redução muito significativa do número de Magistrados do Ministério Público e de Oficiais de Justiça, e ainda a redistribuição e reafectação dos 424 mil processos a novas equipas de magistrados e funcionários em escassos meses.
Esta reforma que o Governo pretende introduzir, contrariamente ao discurso político propagandístico, não visa introduzir racionalidade e eficiência com base em critérios científicos previamente estudados e testados, mas apenas procura: quebrar uma inércia de muitos meses que se sentia dentro do Ministério da Justiça; concentrar serviços para poupar nas rendas absurdamente caras negociadas nos últimos anos; reduzir os lugares de quadro para cobrir as jubilações provocadas pelo desastroso processo legislativo da revisão do EMJ.
A ASJP sempre foi favorável à implementação da “Reforma do Mapa Judiciário” e nunca negou a necessidade de reorganizar os quadros de juízes (nomeadamente em Lisboa e Porto) e de melhorar os critérios de administração e gestão dos tribunais. Sempre houve da parte da ASJP uma colaboração intensa e positiva na criação, instalação e avaliação das actuais comarcas piloto do Alentejo Litoral, Baixo Vouga e Grande Lisboa-Noroeste, como o demonstram os vários documentos elaborados pelo GEOT da ASJP, acessíveis em http://www.asjp.pt/2010/05/05/reforma-do-mapa-judiciario/
Por isso, ninguém venha agora procurar desvalorizar os avisos da ASJP com o estafado e falso rótulo do corporativismo e de ser contra as reformas.
É com tal legitimidade que agora a ASJP tem de afirmar que a reestruturação prevista para a Comarca de Lisboa constitui uma medida política voluntarista e aventureira, sem fundamentação e planeamento suficientes, desarticulada do Conselho Superior da Magistratura e insensível aos avisos que chegam de todo o lado.
A redução abrupta e significativa de juízes, procuradores e oficiais de justiça, a reafectação súbita de centenas de milhares de processos a novas equipas, a mudança física de instalações de muitos deles, o reagendamento de julgamentos e diligências marcadas, a transferência de serviços, pessoas e equipamentos, tudo feito ao mesmo tempo num curto espaço de tempo, vão implicar a paralisação durante meses de dezenas de milhares de processos, com resultados nefastos para os interesses dos cidadãos e empresas e para a já muito depauperada imagem da Justiça.
Contrariamente ao que ocorreu no passado, e quebrando mesmo o compromisso assumido por despacho do Ministro da Justiça, o Governo desta vez entendeu prescindir da colaboração dos Conselhos Superiores e das entidades de representação profissional na área da Justiça, numa preparação atempada e gradual da reforma, tendo-se limitado a apresentar um projecto feito e a promover a audição formal dessas entidades no curtíssimo prazo de 10 dias.
Por isso, esta reforma, pela maneira como é concebida, anunciada e implementada, responsabilizará apenas o Governo, a quem terão de ser pedidas tais responsabilidades.
Lisboa, 2 de Março de 2011
A Direcção Nacional da AJSP