
Enriquecimento de ex-ministros
Ex-ministros ficam ricos com a política
Evolução das remunerações de 15 ex-governantes revela que a passagem por Governo valoriza a carreira profissional
DIANA RAMOS
Dina Moura, Armando Vara e Dias Loureiro. Todos eles foram ministros, todos eles tinham salários modestos antes de chegarem ao Governo e todos eles acabaram por fazer carreira no mundo empresarial, aumentando o rendimento anual para valores acima dos cinco dígitos.
Os números não deixam dúvidas e constam no livro 'Como os políticos enriquecem em Portugal', do jornalista do CM António Sérgio Azenha. A obra ilustra os casos de 15 ex-governantes que multiplicaram os rendimentos depois de saírem do Governo. E as fontes são duas: declarações de rendimentos entregues pelos próprios no Tribunal Constitucional e remunerações anuais referidas nos relatórios de governo nas sociedades onde trabalham.
"De todos os governantes que ingressaram em empresas privadas e públicas depois de terem sido ministros ou secretários de Estado, Joaquim Pina Moura é, provavelmente, o caso mais exemplar de como a carreira política pode ser uma experiência decisiva para a valorização da carreira profissional e consequente prosperidade pessoal" lê-se no livro que é lançado na terça-feira. Antes de ingressar no Governo de António Guterres em 1995, Pina Moura declarou 22 814 euros, em 1994. E em 2006, após ter saído do Governo, "apresentou um rendimento anual de 697 338 euros '! Em 12 anos, o seu rendimento anual sofreu "um aumento de 2956%" diz o livro.
Manuel Dias Loureiro, ex-ministro da Administração Interna de Cavaco Silva, terá ganho como ministro, em 1994, quase 65 mil euros. Em 2001, já como trabalhador independente, declarou 861 366 euros. Em sete anos, "a sua remuneração anual aumentou 1225%"!
Armando Vara, ex-secretário de Estado e ministro de Guterres, é um caso semelhante: em 16 anos, passou de um rendimento anual de 59 486 euros em conjunto com a mulher, em 1994, para 822 193 euros, em 2010. Foi, segundo o livro, um aumento de 1282% na remuneração anual.
Transparência quer declarações acessíveis a cidadãos na internet
A Associação Cívica Transparência e Integridade (TIAC) quer que a declaração de património e rendimentos e o registo de interesses dos titulares de cargos políticos sejam unificados e colocados na internet para consulta da sociedade civil. Este " será um dos nossos ca valosde batalha" revelou ao CM Luís de Sousa, investigador e presidente da TIAC, adiantando que a mobilização ocorrerá no início de 2012, quando a TIAC entregar à troika o relatório sobre o sistema nacional de integridade, que traçará um panorama sobre a corrupção no País. Luís de Sousa reconhece que a legislação relativa aos conflitos de interesses "deve ser limada", mas frisa que o principal problema "é a falta de mecanismos de controlo". E frisa: "Não adianta que uma entidade verifique se a declaração patrimonial é entregue e depois não confirme que os dados lá presentes são ou não verdadeiros " Ou seja: "Deveria haver um cruzamento da informação com outras bases de dados".
Da tutela da energia para líder da espanhola Iberdrola em Portugal
Joaquim Pina Moura, enquanto ministro da Economia e das Finanças, teve em mãos a reestruturação do sector energético, um tema que motivou polémica e que justificou a criação de uma comissão de inquérito parlamentar relativo à entrada da Eni e da Iberdrola no capital da Galp.
Ora, após sair do Executivo e depois de uma curta passagem pelo Parlamento, Pina Moura passou para o sector privado, ocupando o lugar de presidente da Iberdrola em Portugal.
Impedimentos devem ser objecto de debate sério
Com remunerações brutas inferiores a seis mil euros por mês, entre salários e despesas de representação, vale a pena ser ministro ou secretário de Estado em Portugal?
A questão foi o ponto de partida para o jornalista António Sérgio Azenha encontrar 15 casos de políticos que protagonizaram "transferências milionárias" para a esfera empresarial. Do livro 'Como os políticos enriquecem em Portugal' constam nomes como os de Jorge Coelho, Faria de Oliveira, Fernando Gomes, António Vitorino ou Luís Mira Amaral.
" Com este livro quis contribuir para que seja feito um debate sério sobre o regime de incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos", afirma António Sérgio Azenha, sublinhando que "os grupos de interesses fazem parte das regras do jogo na política e na "O lóbi existiu sempre e há-de continuar a existir", acrescenta.
Receios sobre a possibilidade de o livro incomodar o poder não existem: "Numa democracia saudável, o acto de incomodar o poder deve ser encarado como um exercício de cidadania." A informação publicada no livro, explica, "é toda pública." V.F.
Correio Manhã | domingo, 09 Outubro 2011