
Feriados municipais. Lei obriga funcionários públicos a trabalhar
Dia 13 de Junho é feriado em Lisboa mas todas as repartições públicas devem estar abertas. A menos que o Conselho de Ministros tivesse decidido o contrário, o que não aconteceu
ISABEL TAVARES
Os funcionários públicos têm de trabalhar todos os dias da semana, incluindo feriados municipais, ou estão a violar a lei. Tribunais, repartições de Finanças ou Segurança Social são alguns dos serviços que têm de abrir portas à hora do costume, sob pena de serem responsabilizados pelo seu encerramento.
A lei em vigor não deixa margem para dúvidas: para gozarem o feriado municipal, seja o de Oeiras, que aconteceu ontem, seja o de Lisboa, na próxima quinta-feira, ou o do Porto, no dia 24 de Junho, os funcionários públicos têm de ter uma autorização do governo. E não há excepções.
Fazer ou não feriado depende do Conselho de Ministros e de mais ninguém.
No entanto, este ano, pelo menos até à última reunião, que teve lugar quinta-feira passada, não houve qualquer deliberação neste sentido a envolver feriados municipais.
A conclusão é simples: está tudo ilegal.
Dos 308 feriados municipais, a grande maioria realiza-se de Maio para a frente, concentrando-se sobretudo nos meses de Junho, Julho e Agosto. Mas há feriados no país quase todos os dias do ano.
O imbróglio está criado. E a lei em vigor não está a ser cumprida. O i contactou diversos advogados que confirmam esta interpretação.
Tiago Pilo, responsável pela área de Laborai do escritório Vieira d'Almeida, explica que "para que os trabalhadores que exercem funções públicas, nas modalidades de nomeação e de contrato, gozem os feriados facultativos - de que o 13 de Junho é exemplo, em Lisboa -, é necessária uma deliberação do Conselho de Ministros nesse sentido".
Rodrigo Esteves de Oliveira, da área de Público do mesmo escritório, corrobora: "Pressupondo, claro, que só estão em causa os trabalhadores do Estado e que, portanto, não vai ser o Conselho de Ministros a decidir se os funcionários da Câmara Municipal de Lisboa, ou qualquer outra, vão ou não gozar o respectivo feriado".
A única deliberação do Conselho de Ministros tomada este ano e que envolveu feriados facultativos foi relativa ao Carnaval. Ainda assim, poucos fizeram caso. O governo decidiu não dar tolerância de ponto aos funcionários públicos, adiantando que esse princípio se manteria pelo menos durante a aplicação do Programa de Assistência Económica e Financeira a Portugal.
Para as empresas públicas de transportes, por exemplo, a terça-feira manteve-se dia feriado. A Federação dos Sindicatos de Transportes e Comunicações justificou-se dizendo que o feriado é ditado por grande parte das convenções colectivas.
Transtejo, Carris e Metro pararam e CP também, até porque era dia de greve. Os CTT também gozaram feriado, apenas com algumas estações de correios abertas.
A Assembleia da República funcionou normalmente, até porque a terça-feira costuma ser um dia preenchido para as comissões parlamentares. Também para os ministérios, secretarias de Estado e serviços que lhe estão directamente ligados foi um dia normal. Para estes organismos o feriado de Lisboa, dia 13 de Junho, será um dia de trabalho normal.
É que uma boa parte dos serviços governamentais está centralizada na capital e o entendimento é que o governo é nacional, pelo que os que lá trabalham não têm de gozar um feriado municipal específico, uma deliberação que vem do tempo em que Cavaco Silva foi primeiro-ministro.
A CULPA DOS AUTARCAS Nuno Pais Gomes, da Sérvulo Correia & Associados, interpreta a lei da mesma forma: "Para gozarem um feriado facultativo, os trabalhadores da administração pública, sob tutela do governo, têm necessidade de obter a aprovação do Conselho de Ministros."
O advogado considera ainda que os trabalhadores das autarquias têm um regime idêntico, embora se possa questionar se as autarquias tem competências próprias. "Aqui, a primeira inclinação é para afirmar que têm de cumprir o requisito do Conselho de Ministros". De facto, existe uma administração central e uma administração local, mas ambas são compostas por funcionários públicos.
Apesar disso, há autarquias com entendimentos diferentes. Ontem em Oeiras todas as repartições públicas estiveram encerradas devido ao feriado municipal.
As repartições de Lisboa contactadas pelo í também disseram que estaria fechadas na quinta-feira, para as festas de Santo António.
Sobre esta matéria, Nuno Pais Gomes esclarece que muitas vezes as medidas são tomada com "luvas de pelica", ou seja, os autarcas acabam por contornar a lei. Compete aos presidentes de câmara decidir os assuntos relacionados com a gestão dos recursos humanos, da mesma forma que têm competências específicas para fixar o feriado local. "No entanto, fixar não significa gozar."
Certo é que gozar feriados municipais sem deliberação clara do Conselho de Ministros "é uma violação da lei, e os decisores podem ser responsabilizados por isso".
O que diz a lei. A dependência do Conselho de Ministros
LEI 66/2012,31 DE DEZEMBRO
ARTIGO 5.°
São aditados à Lei n ° 59/2008, de 11 de Setembro, alterada pela Lei n.° 3-B/2010, de 28 de Abril, pelo Decreto-Lei n.° 124/2010, de 17 de Novembro, e pela Lei n.° 64-B/2011, de 30 de Dezembro, os artigos 8.°-A e 8.°- B, com a seguinte redacção:
ARTIGO 8.°A
FERIADOS
1. Sem prejuízo do disposto nos números seguintes ou em lei especial, é aplicável aos trabalhadores que exercem funções públicas, nas modalidadesde nomeação e de contrato, o regime de feriados estabelecido no Código do Trabalho.
2. A observância dos feriados facultativos previstos no Código do Trabalho depende de decisão do Conselho de Ministros, sendo nulas as disposições de contrato ou de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho que disponham em contrário.
3. A aplicação do disposto no número anterior às administrações regionais efectua-se com as necessárias, adaptações no que respeita às competências dos correspondentes órgãos de governo próprio.
CÓDIGO DO TRABALHO
ARTIGO 235.°
FERIADOS FACULTATIVOS
1. Além dos feriados obrigatórios, podem ser observados a título de feriado, mediante instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou contrato de trabalho, a terça-feira de Carnaval e o feriado municipal da localidade.
2. Em substituição de qualquer feriado referido no número anterior, pode ser observado outro dia em que acordem empregador e trabalhador.
ARTIGO 236.°
REGIME DOS FERIADOS
1. Nos dias considerados como feriado obrigatório, têm de encerrar ou suspender a laboração todas as actividades que não sejam permitidas aos domingos.
2. O instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou o contrato de trabalho não pode estabelecer feriados diferentes dos indicados nos artigos anteriores.
i | Sábado, 08 Junho 2013