
JUIZES NA MIRA DO CDS
Manuel A. Magalhães*
Centristas querem atacar «privilégios» nas pensões das classes profissionais que escapam aos novos cortes - como os juizes do TC que podem chegar à reforma em apenas 10 anos. No Governo, o núcleo 'passista' hesita. O Ratton tem nas mãos vários diplomas-chave do Orçamento.
O CDS promete atacar os regimes de excepção na contagem do tempo de reforma e no valor das pensões. Na mira estão os juizes, que têm vários benefícios - incluindo os do Tribunal Constitucional. O tema é delicado e divide o próprio Governo, numa altura em que este se sente refém dos magistrados do Palácio Ratton, chamados a pronunciar-se sobre a constitucionalidade de uma série de leis.
A versão pré-aprovada em Conselho de Ministros sobre a convergência das pensões da Caixa Geral de Aposentações (CG A) com as do sector privado implica um corte de 10%, mas não abrange todos os funcionários públicos. E a reforma completa conseguida em 10 ou 12 anos de serviço dos magistrados do Tribunal Constitucional (TC) fica intocada.
Ao SOL, o líder parlamentar do CDS, Nuno Magalhães, afirma que o CDS não vai «aceitar privilégios» de c asses profissionais. «O grupo parlamentar do CDS, quando tiver conhecimento do Orçamento do Estado e em sede de especialidade, procurará, no quadro da maioria parlamentar, encontrar as formas mais equitativas e equilibradas para que ocorra uma distribuição justa dos esforços dos portugueses, sem aceitar privilégios de qualquer sector ou classe profissional» - declara o deputado, questionado sobre a manutenção de regimes diferenciados na função pública para magistrados e diplomatas. No caso das reformas-relâmpago dos juizes do TC, também o BE admite alterações. A direcção parlamentar do Bloco «está a estudar este assunto», respondem os bloquistas ao SOL. O caso mais conhecido de como os juizes do TC beneficiam de regras simpáticas é o de Assunção Esteves, hoje presidente da Assembleia da República, que se reformou aos 40 anos com uma pensão de sete mil euros, por ter sido juíza no Palácio Ratton durante 12 anos.
Receio do efeito-ltália
No núcleo duro do 'passismo', o tema é encarado como de «risco elevado» - e, portanto, tratado com pinças, no momento em que o TC se prepara para analisar uma série de leis centrais para o próximo Orçamento do Estado desdelogo a dos despedimentos na função pública, que o Presidente da República já remeteu para o TC. «É um caso típico em que seremos criticados em qualquer dos casos, seja a decisão aplicar esses cortes ou não os aplicar».
Mesmo assim, há quem desaconselhe Passos a entrar nessa 'guerra' com os juizes do TC. «Quando se toca no estatuto e na remuneração dos juizes, há o risco se sermos acusados de intromissão no poder judicial». Em Itália, houve um caso destes: o Governo de Mário Monti fez um corte nos salários dos juizes, que foi declarado inconstitucional, por violação do estatuto de independência da magistratura. Nestes meses finais de 2013, acrescenta a mesma fonte ouvida pelo SOL, «o TC analisará diplomas muito sensíveis. Há momentos melhores» para levantar a questão. É previsível ainda que as 40 horas de trabalho na função pública e os cortes nas reformas da CGA também vão parar ao Ratton.
Este fim-de-semana, porém, na SIC, o ex-líder do PSD, Marques Mendes, pressionava o Governo a agir. As reformas ao fim de 10 ou 12 anos de serviço dos juizes do TC (consoante tenham 40 ou menos anos de idade) constituem um «regime imoral, inaceitável», disse.
Na mira de Mendes estiveram ainda as subvenções que continuam a ser pagas a alguns ex-titulares de cargos políticos: «Espero que haja uma decisão moralizadora». Neste caso, porém, o ministro-adjunto, Poiares Maduro, já tinha garantido que o Governo ajustará estas subvenções «de forma equivalente aos sofrimentos» dos portugueses. Por seu turno, Marcelo Rebelo de Sousa, na TVI, considerou politicamente significativo que as reformas-relâmpago dos juizes do TC não fossem tocadas. E, referindo-se à convergência de pensões da CGA, disse que o regime de excepção para juizes e diplomatas «deve ser bem explicado».
Quanto ao valor das reformas, juizes e diplomatas escapam aos cortes de 10% porque as suas reformas estão indexadas aos ordenados dos profissionais no activo. Isto levou a que sofressem já um corte na pensão no ano passado, precisamente por isso, lembra Mouraz Lopes, presidente da Associação Sindical dos Juizes Portugueses. «Se houvesse novos cortes, estaríamos perante uma dupla tributação», diz ao SOL. Além da mesma indexação, os diplomatas têm ainda bonificações na contagem de tempo para efeitos de aposentação, pelo serviço prestado no estrangeiro. As bonificações variam entre 10% a 20%, consoante as zonas onde estiveram colocados. Mas podem ir até 25%, no caso de países com guerra civil ou internacional.
*com David Dinis
Troika só volta depois do TC
Próxima visita só depois da decisão sobre despedimentos no Estado. Governo espera promulgação das 40 horas.
A data ao certo ainda não está fechada, mas a próxima visita da troika só vai acontecer depois de o Tribunal Constitucional se pronunciar sobre o diploma da 'requalificação' da Administração pública. Trata-se da lei que o Presidente enviou para fiscalização preventiva esta semana e que abre a hipótese de 'despedimentos' no Estado ao fim de um ano em mobilidade.
O Governo procurou ainda convencer os técnicos a antecipar a visita para o final de Agosto, de forma a ter mais tempo de compor o Orçamento de 2014. Mas a Comissão Europeia e o FMI, apurou o SOL, querem iniciar a próxima revisão a meio de Setembro, provavelmente no dia 16. A decisão dos juizes do Palácio Ratton será conhecida no limite no dia 9. Hoje mesmo saber-se-á se Cavaco Silva vai também mandar para fiscalização preventiva outra lei importante para a construção do próximo OE: a que impõe 40 horas de trabalho no Estado, o mesmo limite que se aplica já ao sector privado. O Governo acredita que o Presidente não o fará neste caso, que considera mera aproximação entre sectores público e privado. Se assim for, o diploma acabará no TC, mas depois da publicação. Toda a esquerda parlamentar prometeu pedir essa fiscalização constitucional.
Começando a meio de Setembro, a avaliação da troika (que é dupla, a oitava e nona, devido ao atraso provocado pela crise política) terá um efeito colateral politicamente conveniente ao Governo: as conclusões da avaliação (e as medidas de consolidação) só devem ser conhecidas depois das eleições autárquicas, que se realizam no dia 29 de Setembro.
SOL | Sexta, 16 Agosto 2013