
Maioria vai cortar subvenção vitalícia dos políticos e hesita em mexer nas pensões do Constitucional
Depois de anunciar o corte das pensões pagas pela Caixa Geral de Aposentações (CGA), no âmbito da convergência entre o regime da CGA e da Segurança Social (ver pág. 3), o Governo quer mostrar que os sacrifícios tocam a todos e está a preparar, com os grupos parlamentares da coligação, cortes nas regalias dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos. "Ninguém fica fora do esforço que todo o país está a fazer" — é a mensagem que a maioria quer passar.
Em relação às pensões auferidas pelos antigos políticos, a decisão está tomada: são mesmo para cortar, de forma vigorosa. "As subvenções vão ser fortemente cortadas", garante fonte oficial do Governo. Na mira estão, entre outros, ex-deputados, ex-governantes e antigos Presidentes da República, que recebem subvenções vitalícias (uma regalia que acabou em 2005, mas que continuou a ser paga aos que, nessa altura, já a recebiam).
A dúvida é o que fazer em relação aos juizes do Tribunal Constitucional, que têm um estatuto único, especialmente favorável. Está em cima da mesa a possibilidade de cortar as suas pensões, mas também está a ser analisada uma revisão geral das regalias que lhes são garantidas, acabando com o estatuto de excecionalidade de que beneficiam os juizes do Palácio Ratton. O assunto tem sido falado "informalmente" ao mais alto nível entre os membros do Governo, apurou o Expresso junto de fontes do Conselho de Ministros.
A ala CDS é a que se tem mostrado mais favorável a mexer nos benefícios destes magistrados, em nome da "justiça e equidade". Mas no núcleo duro do Governo há quem avise que "neste momento seria muito delicado" investir contra as regalias do TC, "pois podia parecer, por um lado, um confronto, e por outro lado, uma pressão".
"Seria particularmente problemático fazer isso neste momento", avisa a mesma fonte, notando que as principais decisões do Governo em relação à reforma do Estado — como a requalificação dos funcionários públicos, as 40 na função pública ou a convergência dos regimes de pensões — estão ou estarão nas mãos do Tribunal Constitucional.
Entre os defensores de que se mexa já no regime do TC há quem note que vale a pena o risco, pois estão em causa "benefícios injustificados". Mesmo que um corte nas regalias indisponha ainda mais o Palácio Ratton contra o Governo.
Reformados ao fim de 10 anos
Os 13 juizes que compõem o TC têm um estatuto único que lhes permite beneficiar do regime de previdência "mais favorável aplicável ao funcionalismo público" seja ele qual for. Atualmente, beneficiam do regime dos magistrados, que indexa o valor da pensão de reforma à dos salários dos juizes no ativo. Findo o seu mandato (do qual são inamovíveis) os juizes do Constitucional podem requerer a aposentação sem passarem por qualquer junta médica.
A reforma é concedida ao cabo de 12 anos de serviço, independentemente da idade ou, em alternativa, aos juizes com 40 anos de idade e 10 de descontos para a CGA. Não estão, por isso, abrangidos pela idade mínima de reforma, que passa a ser de 66 anos. É o caso da presidente do Parlamento, Assunção Esteves, que beneficia do estatuto de pensionista do TC, de que se reformou com 42 anos.
Aliás, Assunção Esteves optou por auferir a pensão de reforma (de €7255), prescindindo do seu salário de presidente da AR, que é mais de €2 mil inferior à reforma a que tem direito vitalício.
Uma vez que se trata de uma competência exclusiva do Parlamento (por essa razão nem os juizes do TC nem os ex-titulares de cargos políticos são abrangidos pelo diploma do Governo para a convergência dos regimes de pensões), a iniciativa seria sempre de um grupo parlamentar — e é possível que uma proposta nesse sentido apresentada por parte da maioria possa recolher apoios à esquerda. Para a coligação, seria uma benesse não ficar sozinha em mais uma guerra contra o TC. Isto, claro, se a coligação se decidir a "comprar" essa batalha.
FILIPE SANTOS COSTA e ROSA PEDROSO LIMA
fscosta@ expresso.impresa.pt
EXCEÇÕES
Diplomatas e juizes poupados
"O Ministério da Justiça não está a preparar qualquer alteração legislativa que permita cortes nas pensões de reforma a magistrados", disse o gabinete de Paula Teixeira da Cruz. O regime de aposentação dos juizes — tal como o dos diplomatas — vai ficar isento dos cortes até 10% previstos no âmbito da convergência entre a CGA e a Segurança Social.
A explicação é simples: os ministros da tutela estão contra, alegando que as reformas destas carreiras estão indexadas aos salários dos trabalhadores no ativo, pelo que já sofreram os cortes que atingiram toda a Administração Pública.
"Se fossem alvo de novos cortes, seriam duplamente penalizados", diz a Justiça. "Não nos incumbe estudar ou preparar qualquer projeto visando a redução das pensões dos funcionários diplomáticos", acrescenta o MNE. As Finanças pretendiam abranger juizes e diplomatas no novo pacote de cortes, mas a situação não é fácil. Por serem um órgão de soberania com proteção constitucional, qualquer alteração à carreira dos juizes é da exclusiva responsabilidade da AR. Aliás, Sócrates cortou 10% nas pensões dos magistrados e foi derrotado em tribunal. R.P.L.
Expresso | Sábado, 17 Agosto 2013