
"Com mais chumbos do TC será difícil acabar a legislatura"
Líder parlamentar do PSD diz que, se as leis sobre o corte de salários e pensões forem travadas,"tudo poderá entrar em crise"
Se o Tribunal Constitucional rejeitar, na semana que vem, as leis sobre o corte de salários da função pública e a Contribuição de Sustentabilidade sobre as pensões, "será muito difícil" ao Governo elaborar o Orçamento do Estado e concluir a legislatura, avisa o líder parlamentar do PSD. Em entrevista, Luís Montenegro recusa a ideia de que esteja a pressionar os juizes — "pressionados estamos todos nós." Sobre as presidenciais, diz que não há problema se houver vários candidatos à direita: aos partidos basta apoiar o que passar à segunda volta.
Luís Montenegro Líder parlamentar do PSD "Com mais chumbos do TC será muito difícil cumprir a legislatura"
FILIPE SANTOS COSTA PAULO ALEXANDRINO
O líder parlamentar do PSD diz que, se o Tribunal Constitucional (TC) anunciar novos chumbos na semana que vem, "Estado social, pagamento de salários, tudo poderá entrar em crise". E será difícil o Governo continuar.
- Na próxima semana o TC decide sobre o corte dos salários dos funcionários públicos e a Contribuição de Sustentabilidade, que corta definitivamente as pensões. Vê estas decisões do TC como uma roleta russa?
- É verdade que tem sido relativamente difícil antecipar as decisões do TC... A nossa convicção é que as medidas estão conformes à Constituição, e adequadas a uma realidade concreta: estamos condenados a ter finanças públicas equilibradas na moeda única. Muitas vezes estas decisões têm sido apresentadas como sendo sobre este Governo, mas são decisões de jurisprudência constitucional que terão impacto em vários governos nos próximos anos.
- O acórdão da semana passada, que viabilizou o alargamento da CES, que sinal dá para as decisões que vêm aí?
- É difícil uma extrapolação. O importante é que o TC não empurre o país para uma situação de ingovernabilidade. São duas decisões importantes. Uma, sobre a taxa de sustentabilidade sobre as pensões, que, ao contrário da CES, é uma medida estrutural, para garantir que as pensões ficam asseguradas nos próximos anos. Por outro lado, há uma medida transitória, a redução salarial na administração pública — uma redução equivalente à que se tomou antes da ajuda externa, e que é imprescindível para cumprirmos as metas sem aumentar impostos. E é uma medida que hoje tem um calendário: vai ser removida 20% no próximo ano e assim sucessivamente.
- O "sucessivamente" não está explícito na lei, que só garante a reposição de 20% no ano eleitoral...
- Mas está explícito que o Governo pretende nos quatro anos seguintes remover o impacto desta redução salarial. Se estas duas medidas não passarem, o Estado terá de arranjar alternativas. Todas as que foram testadas antes foram inviabilizadas. Se agora estas medidas também forem, e conforme o próprio TC disse num acórdão anterior, a solução seria um aumento de impostos. No limiar em que estamos, qualquer aumento de impostos terá repercussões económicas e gera mais dificuldades.
- Não há mais alternativas?
- A margem é muito estreita. Não digo que não há alternativas, mas ninguém as conhece.
- Se o TC disser que devem ser repostos de uma vez os níveis salariais e as pensões, o Governo tem condições para fazer o Orçamento do Estado (OE) e manter-se em funções?
- Espero que as decisões do TC não tragam um cenário de ingovernabilidade. Não tem a ver com este Governo, tem a ver com este e qualquer outro.
- Há condições para fazer o OE e cumprir a legislatura?
- Será muito difícil, na medida em que a alternativa mais viável é o aumento dos impostos numa dimensão que creio ser incomportável. Estamos numa situação política muito complicada que tem a ver com as garantias de financiamento do Estado, e com as condições para o Estado cumprir as suas principais obrigações. Estado social, pagamento de prestações sociais, pagamento de salários, tudo poderá entrar em crise se se inviabilizar esta diminuição de despesa, ou se houver um aumento de impostos muito nefasto para a economia. Há muita gente que diz que isto é uma pressão sobre o TC. Eu diria que pressionados estamos todos nós.
- Terminada a disputa interna do PS pode haver entendimentos com os socialistas? Ou a proximidade das eleições condiciona tudo?
- Não faz sentido analisar essa questão de forma irrealista. É evidente que todas as dificuldades que tivemos nestes três anos dificilmente serão suplantadas em ano eleitoral. O PS tenta sempre cavalgar as ondas de contestação, e isso tanto afeta António José Seguro como António Costa. Aliás, eles estão mais próximos do que aquilo que às vezes querem demonstrar.
- Fala na dificuldade de entendimento, mas vemos António Costa e Rui Rio em grande sintonia. Se calhar o problema são os protagonistas?
- Discordo desse foguetório criado à volta desses encontros e dessas putativas convergências. Rui Rio, do ponto de vista programático, tem uma visão muito próxima daquela que o PSD tem tido. E a vontade de Rui Rio de entendimento com o PS é a mesma que a nossa, mas é mais fácil parecer que isso é exequível com alguém que está fora do que com quem está dentro. Não há um problema de protagonistas, há um problema de política.
- Não lhe parece que se está a constituir um ticket António Costa/Rui Rio?
- Nunca percebi que houvesse essa intenção. Nem me parece que fosse um caminho correto.
- Falou-se na indicação de um comissário europeu próximo do PS. Portas terá até sugerido Jaime Gama. Mas não foi esse o caminho.
- Não sei se isso é verdade. O Governo escolheu uma personalidade com todos os requisitos para fazer um bom mandato. E Carlos Moedas é uma lufada de ar fresco, não podemos estar a falar sempre dos mesmos. Neste ciclo político já emergiram novos protagonistas e Moedas é um deles. Há um ano dizia-se a mesma coisa sobre Maria Luís Albuquerque e hoje ela é considerada imprescindível. Não me admiraria que daqui a um ano estivéssemos a dizer que Carlos Moedas está a brilhar na Comissão Europeia.
- Acha Maria Luís imprescindível?
- A maioria é um bloco estável, coeso, e a ministra das Finanças é uma peça importante neste bloco. Fico muito satisfeito por ela continuar.
- No OE a prioridade é baixar o IRS, como exige o CDS?
- Já tínhamos essa prioridade no OE anterior. E mantemos. Isto não significa que não tenhamos noção da dificuldade que isso acarreta. Veremos, com a execução orçamental deste ano e com a perspetiva do quadro económico para o próximo. Não está fácil.
- Dois partidos que nas europeias tiveram 27% podem vencer em 2015?
- Sócrates teve 29% três meses antes de ganhar as legislativas com 36%. Se isso aconteceu em três meses porque é que não pode acontecer em quinze? O nosso combate é para que os dois partidos juntos possam eleger a maioria absoluta dos deputados.
- O impacto do caso BES na economia pode ditar o destino do Governo?
- É claro que, depois do que aconteceu nos últimos 15 dias, só quem não vive neste planeta é que não tem algumas reservas. Os agentes económicos, os investidores, as pessoas, terão um período para reganhar confiança no sistema e isso tem reflexo na economia. Apesar de preocupado também estou confiante, porque a solução encontrada pode ajudar a ultrapassar isso, sem que a recuperação seja muito posta em causa.
- O ministro da Economia disse que tudo isto é inexplicável — não só o BES, como a "desfaçatez" do que se passou na PT. Que consequências espera?
- Tem de se apurar responsabilidades e deve haver consequências. É preciso apurar se houve crimes, se houve intencionalidade, se houve fraudes, e os responsáveis devem cumprir a condenação que a lei prevê. O país está estupefacto porque ninguém acreditava que isto pudesse acontecer com o BES e a PT.
Expresso | Sábado, 09 Agosto 2014