
Juiz restringiu acesso a número reduzido de funcionários. Notificações vão ser todas seladas
Segredo Carlos Alexandre restringe acesso a processo Sócrates a número limitado de funcionários
Juiz fecha processo
Texto MICAEL PEREIRA e RUI GUSTAVO
O juiz Carlos Alexandre restringiu o acesso ao processo judicial que envolve José Sócrates a um número limitado de funcionários judiciais com quem já tem uma relação de confiança bastante prolongada no tempo. O magistrado do Tribunal Central de Investigação Criminal tomou medidas de precaução extraordinárias na sequência dos vários processos de violação de segredo de justiça que já foram abertos, porque não quer ser envolvido em quaisquer suspeitas.
Uma fonte judicial explica que, por exemplo, "as notificações para os arguidos passaram a ser entregues fechadas e seladas e não por fax", de modo a evitar que mais pessoas possam ter acesso ao conteúdo dos despachos. No DCIAP, o departamento do Ministério Público que conduz as investigações contra o ex-primeiro-ministro, o acesso ao processo também foi restringido a um número curto de funcionários. O procurador Rosário Teixeira, titular do processo, deverá ser ouvido como testemunha num dos processos que também está abrangido pelo segredo de justiça.
Numa entrevista publicada esta semana no "Público" e na Rádio Renascença, a procuradora-geral Joana Marques Vidal admitiu que alguns procuradores "tiveram deslizes" e garantiu que se tem esforçado para travar as fugas de informação "mas não tem conseguido".
Na quinta vez que falou depois de ter sido preso, numa entrevista por escrito à TVI, José Sócrates disse estar a exercer "legítima defesa contra os crimes de violação do segredo de justiça" e "contra um poder obscuro".
O advogado João Araújo foi mais preciso e, no dia em que Sócrates foi ouvido no âmbito de dois processos de violação de segredo de justiça, argumentou que "não há fugas de informação, o que há é a transmissão de informação a partir de quem controla o processo", numa alusão clara aos magistrados do Ministério Público que dirigem o inquérito e ao juiz Carlos Alexandre. "Sócrates sente-se profundamente ofendido pelas violações sucessivas do segredo de justiça que favorecem as versões da investigação e o desfavorecem a ele", acrescentou.
Entrevistas justificam prisão preventiva
Além de tudo o que já tinha argumentado a 24 de novembro do ano passado para justificar inicialmente a prisão preventiva de José Sócrates, incluindo o perigo de fuga, o Ministério Público alegou agora que as várias entrevistas que o ex-primeiro-ministro foi dando por escrito a partir da cadeia de Évora constituem uma atividade persistente de perturbação do processo. E que essa perturbação só não será maior se o principal arguido da Operação Marquês continuar preso. Este facto novo foi tido em conta pelo juiz Carlos Alexandre no reexame dos pressupostos da prisão preventiva, obrigatório a cada três meses, levando aquele magistrado do Tribunal Central de Instrução Criminal a adiar a decisão de manter ou não José Sócrates na cadeia, notificando esta semana os advogados do ex-primeiro-ministro para que se pronunciem sobre o assunto.
Na prática, José Sócrates continua preso preventivamente, mas, apesar de o prazo máximo de três meses já ter sido ultrapassado, ainda não lhe foi comunicado se a medida de coação vai ser prolongada. Pedro Delille, um dos advogados de Sócrates, confirmou ao Expresso que até esta sexta-feira isso não tinha acontecido, recusando-se no entanto a comentar qual o teor do despacho enviado nos últimos dias pelo juiz Carlos Alexandre. "O que eu garanto é que o engenheiro José Sócrates não foi notificado da manutenção da prisão preventiva, apesar de isso ter sido noticiado, o que é no mínimo calunioso para o meu cliente."
Pedro Delille foi esta sexta-feira a Évora com João Araújo para se reunirem com o ex-primeiro-ministro, adiantando que deverão fazer um esclarecimento público na segunda-feira sobre o que se está a passar. "Em princípio, tencionamos abordar esta questão da notificação." Em causa poderá estar precisamente o desrespeito pelo prazo máximo de três meses para o juiz decidir sobre a manutenção da prisão preventiva, que expirou na última terça-feira, 24 de fevereiro.
Para o procurador Rosário Teixeira, a verdade é que a forma como José Sócrates tem abordado publicamente o caso revela uma estratégia em que são abordados factos que não constam do processo mas que contribuem para pôr em causa a imagem da justiça. Como por exemplo ter desmentido as viagens do motorista João Perna a França, algo que o MP sustenta nunca ter alegado. E, ainda segundo o MP, as entrevistas interferem com os depoimentos de testemunhas, desde que aconteceram as detenções de Sócrates e dos outros três arguidos iniciais do caso.
Essa postura, de acordo com o Ministério Público, agrava aquilo que a acusação considerava já ser um perigo de perturbação da prova por parte de José Sócrates antes de ele ser detido e que passava por alegadamente tentar saber junto de fontes bem colocadas sobre o andamento da investigação de que estaria a ser alvo. Em julho de 2014, a revista "Sábado" chegou a noticiar que o antigo líder do PS era suspeito no processo Monte Branco e que estava sob vigilância do DCIAP.
Metade da informação era correta. rgustavo@expresso.impresa.pt
Expresso | Sábado, 28 Fevereiro 2015